Autores: Ilsi Iob Boldrini, Gilsane Lino von Poser e José Angelo S. Zuanazzi / Universidade Federal do Rio Grande do Sul

O bioma Pampa, situado na metade sul do Rio Grande do Sul, é o menor bioma brasileiro em extensão (176.496 km²) e corresponde a 2,07% do território nacional. Tem como matriz principal vegetação campestre, e esta formação é transnacional, tem continuidade no Uruguai, parte da Argentina e sul do Paraguai, a qual é conhecida como Pastizales del Río de La Plata (Soriano et al. 1991).

Segundo o Ministério do Meio Ambiente (2010), o Pampa é o segundo bioma brasileiro mais devastado do Brasil, restando apenas 36% de remanescentes.

O Pampa tem sofrido uma redução drástica na sua área original a partir da década de 70 e tem se acentuado exponencialmente nos últimos anos pela mudança do uso da terra para o cultivo de grãos, com ênfase para a soja, e para o cultivo de florestas, em substituição à pecuária extensiva.

As paisagens naturais do Pampa são caracterizadas pela dominância de vegetação campestre. Em meio aos campos encontram-se matas ciliares nas margens de rios e arroios, matas nas encostas, matas de pau-ferro, formações subarbustivas e arbustivas, butiazais, banhados e afloramentos rochosos.

Como o bioma está situado abaixo do paralelo geográfico 30, em uma região classificada como subtropical, é o limite sul de distribuição de muitas espécies vegetais tropicais, cujo centro de diversidade localiza-se no Brasil central, e outras de origem temperada, que se distribuem ao sul do continente e encontram seu limite mais setentrional neste paralelo. Por esta ser uma região de encontro de diferentes contingentes de floras, a riqueza específica é muito alta (2.150 spp.). Além da riqueza específica alta, muitos endemismos são encontrados nestes campos (260 spp.), pois é uma região de formação geológica muito antiga, com muitos ecossistemas associados. Algumas espécies são muito restritivas, como as cactáceas.

A característica fisionômica das áreas abertas é determinada pela grande cobertura das espécies de Gramíneas. Elas apresentam uma série de estratégias associadas, que as colocam em vantagem sobre as demais espécies vegetais, bem como a sua adaptação a distúrbios como o pastejo e o fogo.

Entre as Asteráceas, apesar de mais numerosas do que as Gramíneas, a grande maioria de suas espécies ocorrem isoladamente. Elas apresentam frutos envoltos por estruturas adaptadas à dispersão pelo vento, facilitando o transporte de suas sementes a longas distâncias.

Muitas espécies de outras famílias se desenvolvem nos campos, como as leguminosas, predominantes em ambientes secos, pois muitas delas apresentam estruturas subterrâneas desenvolvidas, os xilopódios, os quais garantem a sua sobrevivência quando em ambiente e/ou períodos de stress hídrico.

A maioria das Ciperáceas habita solos úmidos a encharcados, onde muitas vezes dominam por conta da alta produção de sementes. Além disso, muitas espécies apresentam multiplicação vegetativa e gemas basais protegidas, o que lhes conferem dominância em terras baixas.

Algumas famílias se destacam pelo alto número específico encontrado no Pampa, como é o caso das Malváceas e as Iridáceas, predominantes nas regiões temperadas e subtropicais e as Cactáceas relacionadas aos ambientes xéricos, aqui representados pelos campos rupestres.

Alguns gêneros se destacam pela alta riqueza específica, como Baccharis (Asteraceae), Paspalum (Poaceae) e Mimosa (Fabaceae). Algumas espécies são muito restritivas quanto aos ambientes que habitam, e outras são mais tolerantes. Estes gêneros têm espécies que habitam todos os ambientes: banhados, campos úmidos, secos e campos rupestres.

Segundo a classificação dos campos para o bioma Pampa, proposta por Hasenack e colaboradores (2010), com base na altitude, declividade, solo, vegetação e uso da terra foram descritos tipos de campos (vide Figura a seguir).

Figura 1: Unidades fitofisionomias presentes no bioma Pampa (Hasenack et al. 2010).

Campos com barba-de-bode: a maioria dos campos desta região foi convertida em lavouras de soja e cultivos de inverno por se situarem sobre solos profundos de fácil mecanização. O que resta de campo é dominado por barba-de-bode (Aristida jubata).

Campos com espinilho: sobre solos rasos úmidos, muitas áreas foram transformadas em lavouras de arroz e sobre solos rasos, de origem basáltica, é praticada a pecuária. O espinilho (Vachellia caven) é a espécie dominante no estrato superior e no estrato inferior muitas espécies de pequeno porte cobrem o solo, como por exemplo, o capim-forquilha (Paspalum notatum), o capim-caninha (Andropogon lateralis) e o pega-pega (Desmodium incanum).

Campos de solos rasos: como os solos são rasos, de origem basáltica, poucas são as áreas transformadas em lavouras. Ocorrem muitas espécies características nestes campos, como as Gramíneas Bouteloua megapotamica e Aristida murina, a Solanácea Nierembergia linariifolia e a Asterácea Baccharis coridifolia, conhecida popularmente como mio-mio, tóxica aos animais. A pecuária, com uma carga animal alta, é a atividade principal da região, deixando muito solo exposto, o que facilita a entrada de invasoras como o capim-annoni (Eragrostis plana).

Campos graminosos: como os solos são muito férteis, grande parte da região foi e continua sendo transformada em lavouras. É a região que apresenta o maior número de espécies hibernais de Gramíneas, como as flechilhas (Nassela spp. e Piptochaetium spp.), e Leguminosas, como as babosas (Adesmia spp.) e o trevo-nativo (Trifolium polymorphum).

Campos com areais: a vegetação da região se desenvolve sobre solos de baixa fertilidade, associado a fatores ambientais severos, apresentando muitas espécies exclusivas. Espécies tóxicas são frequentes, como a Euforbiácea Euphorbia isabellei e a Leguminosa Lupinus albescens. As Gramíneas apresentam estruturas subterrâneas desenvolvidas, como Paspalum lepton e óleos essenciais, como o capim-limão (Elyonurus sp.).

Campos arbustivo: a região também conhecida como Serra do Sudeste apresenta uma vegetação savanóide, com mistura de vegetação lenhosa, em geral baixa, e vegetação campestre. Sobre solos rasos, pedregosos são encontradas muitas Cactáceas. Entre as lenhosas, destacam-se as Asteráceas, chirca (Acanthostyles buniifolius) e Baccharis aliena. São registrados muitos endemismos para a região.

Campos misto de andropogôneas e compostas: poucas áreas de campo nativo persistem, já que a maioria das terras baixas foi transformada em lavouras de arroz e as coxilhas foram convertidas em lavouras de soja. Os campos que restam apresentam uma frequência alta de capim-forquilha, barba-de-bode e pega-paga. Entre as Asteráceas, o alecrim-do-campo (Vernonanthura nudiflora) se destaca.

Campos litorâneos: algumas espécies são exclusivas destes campos sobre solos arenosos, como as Gramíneas Ischaemum minus, Axonopus obtusifolius e Paspalum pumilum. Em solos encharcados as Ciperáceas dos gêneros Eleocharis e Rhynchospora são dominantes.

Exemplos de estruturas químicas inéditas isoladas em plantas nesta região.

Figura 2: Benzopiranos HP1 (1), HP2 (2) e HP3 (3), isolados de Hypericum polyanthemum (Ferraz et al., 2001)

Figura 3: 9-O-demethyllycosinin B, isolada de Hippeastrum breviflorum (Sebben et al., 2015)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Imagens representativas do Bioma Pampa.

Referências:

FERRAZ ABF, BORDIGNON SAL, STAATS C, SCHRIPSEMA J, VON POSER GL. Benzopyrans from Hypericum polyanthemum. Phytochemistry. 2001; 57:1227-1230.

Hasenack, H.; Weber, E.; Boldrini, I.I.; Trevisan, R. 2010. Mapa de sistemas ecológicos das Savanas Uruguaias em escala 1:500.000 ou superior. Porto Alegre, Centro de Ecologia. Relatório técnico Projeto UFRGS/TNC. 18 p.

Ministério do Meio Ambiente. 2010. Mapa de Cobertura Vegetal: Pampa. http://www.mma.gov.br/biomas/pampa.

Soriano, A.; León, R.J.C.; Sala, O.E.; Lavado, R.S.; Deregibus, V.A.; Cahuepe, O.; Scaglia, A., Velazquez, C.A., Lemcoff, J.H. Rio de la Plata grasslands. In: Coupland, R.T. (Ed.), Ecosystems of the World. Natural Grasslands. Introduction and Western Hemisphere. Elsevier,Amsterdam, pp. 367–407, 1992.

SEBBEN, C.; GIORDANI, R.B.; ANDRADE, J. P.; BERKOV S; OSORIO, E. J.; SOBRAL, M.E.G.; DE ALMEIDA, M.V.; HENRIQUES, A.T.; BASTIDA, J.; Zuanazzi, J.A.S. New lycosinine derivative from Hippeastrum breviflorum. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 25, p. 353-355, 2015.